sexta-feira, junho 30, 2006

 

O Activismo diplomático do Irão


Do médio Oriente a África, passando pela Europa e Ásia, com uma especial incidência na Rússia e na China, Mannoucher Mottaki, o ministro iraniano dos negócios estrangeiros, desdobra-se em mil explicações e argumentos. Do Kowait a Viena, passando por Bruxelas, Ali Larijani, o chefe do Conselho Nacional de Segurança e o negociador chefe iraniano sobre a energia nuclear, tem feito, igualmente, muito. E o presidente da República, Mahmoud Ahmadinejad, percorrendo o país para se dirigir às multidões, apoiado, na iniciativa, pelo Guia da República, Ali Khamenei, fonte suprema de autoridade. Todos têm em comum um e o mesmo objectivo: conquistar o maior número de apoios no direito da República islâmica dominar o programa de energia nuclear.

Cada um adaptando o seu estilo a cada público. Um sorriso meio malicioso, meio simpático, sempre infantil, nos lábios, tanto com os seus homólogos como ao pé dos jornalistas, Mottaki espelha a imagem duma equipa dirigente iraniana dura e intratável, reflexo da ascensão à presidência, em Agosto de 2005, do ultra conservador Ahmadinejad. O seu chefe da diplomacia não falta a nenhum encontro, nem foge a nenhuma pergunta, limita-se, na ocasião, a fazer o que lhe compete. A recente sessão anual ministerial da Organização da Conferência Islâmica (OCI), em Bakou, permitiu-lhe verificar a eficácia do seu método. O único dos 57 chefes de delegações a ter participado do primeiro ao último dia, estava na frente e na retaguarda, multiplicando os encontros bilaterais nos bastidores, antes de partir para Roma, depois Génova, satisfeito do seu trabalho alcançado.

Conjugados os esforços conseguidos em conjunto ao longo de várias semanas no Oriente, o seu activismo deu frutos em Bakou. Os que não se cansavam de dizer há meses que se sentiam ameaçados, os ministros dos países mais ou menos preocupados com o programa nuclear iraniano, particularmente aqueles Estados árabes que estão de frente para o Irão na outra costa do Golfo, pareciam ter passado uma esponja sobre o assunto. Na ausência dos chefes das suas diplomacias, estavam representados em Bakou a um nível subalterno. Talvez estivessem convencidos que em todo o caso uma decisão do OCI sobre o programa nuclear pesaria pouco sobre o assunto.

Resultado: o terreno foi deixado livre a Mottaki para desenvolver a sua arte de contacto e persuasão. E sem dúvida alguma que o OCI apoiou o Irão, prestando o seu apoio ao “direito inalienável (…) de desenvolver investigação, produção e utilização da energia nuclear com fins pacíficos”, e pedindo a retoma das negociações “sem condições prévias” entre o Teerão e a Agência Internacional de Energia Atómica (AIEA), e “todas as partes em causa”, por outras palavras, os Ocidentais.

Mottaki, como os outros dirigentes da República islâmica, sabem que o alcance deste apoio é apenas moral e que nenhum país membro do OCI, nem este último como tal, pesará alguma vez tanto como Moscovo ou Pequim. Mas eles não desprezam o prazer da saborear a solidariedade dos governos que, na maior parte, são mais ou menos próximos dos Estados Unidos ou são seus devedores. Eles sabem que uma larga fracção da opinião pública muçulmana, cada vez mais hostil aos Estados Unidos, julgam a sua atitude pela menos corajosa.

Menos eloquente e mais distante que Mottaki, Larijani tem o seu lugar. Antes de tudo, é o primeiro guardião do segredo das negociações do programa nuclear. Embora a decisão última na matéria retorne ao Guia da República, foi sempre o seu homem de confiança, Larijani ocupa uma posição delicada: ele assume a máxima responsabilidade no face a face com os Ocidentais e na avaliação das suas margens de manobra. Isso tem, por vezes, algo de equilibrismo, e, apesar das escolhas e das tensões, Larijani foi bem sucedido ao evitar a ruptura. Isto não é um avanço adquirido, até porque, na verdade, a sua nomeação a chefe de equipa dos negociadores suscitou receios e inquietações. Este antigo director, ultra rígido, da rádio-televisão parece ter tido êxito na sua mudança com os novos fatos de negociador.

ESTRATÉGIA DE COMUNICAÇÃO

Igual a si mesmo, Ahmadinejad adapta a sua marca populista a esta estratégia de comunicação. Duma ponta à outra do Irão, vai fazer vibrar a veia nacionalista, contra um Ocidente – em particular os Estados Unidos –, qualificados de arrogantes e imperialistas. Assegura às massas que a República islâmica não faz mais do que defender “os direito de todos os Iranianos” ao controlar o programa de energia nuclear ”com fins pacíficos”. Há, diz ele, progresso e desenvolvimento do país em todos os sectores e aqueles que querem privar a República islâmica do seu direito são os mesmos que têm a bomba atómica. Marca pontos, no seio de uma população que não pede tanto para exprimir o seu orgulho nacionalista à flor da pele. Quanto ao Guia da República, promete a mais dolorosa das respostas a todas as agressões de que o seu país possa vir a ser alvo.

Qual será o peso das solidariedade exprimida face a um Ocidente qualquer – Estados Unidos e União Europeia –, determinado a colocar paninhos quentes invés de julgar os riscos de militarização do programa nuclear do Teerão? Até agora, o Irão conseguiu, graças nomeadamente à China e à Rússia, desviar o espectro do embargo do seu programa nuclear para Conselho de Segurança da ONU, e o das sanções. Conseguiu uma nova oferta ocidental de cooperação, mais generosa que aquela apresentada há pouco mais de um ano, para o convencer a renunciar ao enriquecimento de urânio. Conseguiu mesmo a promessa de uma participação dos Estados Unidos nas negociações sobre o programa nuclear se aceitarem as propostas ocidentais transmitidas a 6 de Junho.

Desde desta data, o tom dos dirigentes iranianos tem-se globalmente alterado no que diz respeito ao Ocidente. Sem estar a revelar o teor, Teerão, que diz estudar “com a maior seriedade” o “pacote” que lhe foi proposto, já qualificou de “positivo” alguns aspectos desta oferta, mas julga que outros requerem algumas explicações, enquanto que outros são ainda inaceitáveis. Continua a dizer que não renunciará ao enriquecimento de urânio e promete dar a sua resposta definitiva para meados de Agosto. Os Estados Unidos desejam a resposta para meados de Julhos e os outros Ocidentais começam a perder a paciência. Até agora, o Irão procurou e conseguiu ganhar tempo, mas a hora da verdade aproxima-se.

Mouna Naïm (traduzido por João Entresede)

Artigo publicado no jornal Le Monde, na edição de 29.06.06


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