domingo, julho 09, 2006
O calendário de Freitas (II)
Não gosto muito do exercício mas hoje vou (auto)citar um artigo que escrevi neste jornal do dia 19 de Maio: “O dilema de José Sócrates é claro: por ele, Freitas deve continuar até ao fim do mandato, mas nada pode fazer com que a presidência portuguesa corra mal. E, a verdade, é que no MNE o calendário já é curto. A presidência é daqui a um ano e tem que ser muito bem preparada, o que exige muito trabalho diário. E é por isso que a situação de Freitas tem que ficar resolvida (na cabeça do próprio, do primeiro-ministro e aos olhos de todos) no início de Julho. Mais tempo só vai prolongar o totobola da remodelação”.
O que eu escrevi na altura não era nenhum segredo, bem pelo contrário. Toda a gente que “frequenta” a política e/ou o jornalismo tinha percebido o objectivo da entrevista que Freitas do Amaral concedeu à Cândida Pinto no Expresso. É claro que o título e a notícia de primeira página lhe saíram do controlo, mas a mensagem que Freitas queria passar era simples: cansaço, dor de costas grave e insuportável, sentido de missão cumprida e, acima de tudo, abrir a porta para sair do Governo a tempo de o seu sucessor preparara a presidência da UE.
A entrevista cumpriu o seu objectivo, embora com um estrondo desnecessário para o Governo e foi muito bem aproveitada pelo Expresso, como agora se confirma. Depois da entrevista foi só esperar por Scolari. Com o País em levitação colectiva, Sócrates conseguiu fazer (com a preciosa ajuda de Cavaco) a primeira remodelação da nossa história que chegou às redacções por ‘e-mai’l e por ‘SMS’! Pelo menos, o choque tecnológico já chegou às remodelações.
Mais do que o segredo da operação (de que já toda a gente estava à espera mas sem data confirmada), o que é extraordinário é a frieza de José Sócrates. Fez a remodelação num dia em que já sabia que ninguém ia dar por ela. A única remodelação que (nos) interessava nessa sexta-feira era a da equipa de Scolari, mais concretamente saber se Ronaldo ia jogar e pouco mais.
Feito o balanço desta passagem pelo Governo, acho que ela não serviu muito a Freitas e serviu pouco ao Governo. Mas entendo que o Executivo fica muito menos rico sem Freitas do Amaral. Apesar de ter ficado muitas vezes perplexo com declarações ou actos seus, reconheço que Freitas é das personalidades mais heterodoxas que habitam Portugal. Mesmo quando pensa mal (ou não pensa sequer), Freitas fá-lo pela sua própria cabeça. E esse é um bem escasso na política portuguesa, para não falar de tudo o resto (a começar pelos empresários, que, na maior parte, se limitam a repetir opiniões básicas e a acenar a cabeça ao Governo).
É claro que o “cimento” do Governo não se faz de personalidades como Freitas. Nesse aspecto, Luís Amado e Severiano Teixeira são seguros. Quando se olha para o Governo vê-se claramente uma equipa e quem é o chefe. Mas fica a faltar algo que pessoas como Freitas do Amaral ou Campos e Cunha trazem a um executivo.
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Ricardo Costa, Director da SIC Notícias
Artigo opinião da edição on-line do jornal Diário Económico
O que eu escrevi na altura não era nenhum segredo, bem pelo contrário. Toda a gente que “frequenta” a política e/ou o jornalismo tinha percebido o objectivo da entrevista que Freitas do Amaral concedeu à Cândida Pinto no Expresso. É claro que o título e a notícia de primeira página lhe saíram do controlo, mas a mensagem que Freitas queria passar era simples: cansaço, dor de costas grave e insuportável, sentido de missão cumprida e, acima de tudo, abrir a porta para sair do Governo a tempo de o seu sucessor preparara a presidência da UE.
A entrevista cumpriu o seu objectivo, embora com um estrondo desnecessário para o Governo e foi muito bem aproveitada pelo Expresso, como agora se confirma. Depois da entrevista foi só esperar por Scolari. Com o País em levitação colectiva, Sócrates conseguiu fazer (com a preciosa ajuda de Cavaco) a primeira remodelação da nossa história que chegou às redacções por ‘e-mai’l e por ‘SMS’! Pelo menos, o choque tecnológico já chegou às remodelações.
Mais do que o segredo da operação (de que já toda a gente estava à espera mas sem data confirmada), o que é extraordinário é a frieza de José Sócrates. Fez a remodelação num dia em que já sabia que ninguém ia dar por ela. A única remodelação que (nos) interessava nessa sexta-feira era a da equipa de Scolari, mais concretamente saber se Ronaldo ia jogar e pouco mais.
Feito o balanço desta passagem pelo Governo, acho que ela não serviu muito a Freitas e serviu pouco ao Governo. Mas entendo que o Executivo fica muito menos rico sem Freitas do Amaral. Apesar de ter ficado muitas vezes perplexo com declarações ou actos seus, reconheço que Freitas é das personalidades mais heterodoxas que habitam Portugal. Mesmo quando pensa mal (ou não pensa sequer), Freitas fá-lo pela sua própria cabeça. E esse é um bem escasso na política portuguesa, para não falar de tudo o resto (a começar pelos empresários, que, na maior parte, se limitam a repetir opiniões básicas e a acenar a cabeça ao Governo).
É claro que o “cimento” do Governo não se faz de personalidades como Freitas. Nesse aspecto, Luís Amado e Severiano Teixeira são seguros. Quando se olha para o Governo vê-se claramente uma equipa e quem é o chefe. Mas fica a faltar algo que pessoas como Freitas do Amaral ou Campos e Cunha trazem a um executivo.
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Ricardo Costa, Director da SIC Notícias
Artigo opinião da edição on-line do jornal Diário Económico