quarta-feira, julho 12, 2006

 

O Iraque e o vazio

Para os iraquianos, quer fossem a favor ou contra a intervenção militar americana, a presença estrangeira justificava-se por uma razão: evitar a guerra civil. Três anos depois da invasão do Iraque e da queda de Sadam Hussein, os americanos não partiram, estão lá, e a guerra civil também.

O sangrento domingo de 9 de Julho, um “Bloody Sunday” à iraquiano, marcará uma viragem na guerra. Pela primeira vez, os habitantes de Bagdad, peões e automobilistas desarmados, foram sistematicamente executados, depois de um simples controlo de identificação, apenas pela sua origem tribal. Na verdade, foram cercados nas suas casas. No bairro Al-Jihad, cerca de 57 sunitas foram, deste modo, mortos por homens mascarados, certamente pertencentes às milícias chiitas.

É também a primeira vez, desde que os assassinatos entre sunitas e chiitas se multiplicam, agravando-se com da explosão de “Mesquita de Ouro” de Samarra, em Fevereiro, que as milícias chiitas invadem deste modo um bairro sunita. O cerco repetiu-se a 10 de Julho à tarde no bairro de Ghazaliya. Os habitantes sunitas esconderam-se nas suas casas para evitar sofrer o mesmo destino que os de Al-Jihad.

Do ponto de vista iraquiano, esta reviravolta deita por terra a última justificação da presença militar americana. As outras justificações, as apresentadas em Washington, não fazem ninguém sonhar por muito mais tempo: a “democracia”, não pode existir, apesar de eleições bem sucedidas, quando o caos toma conta dos pais; a “reconstrução”, amarga ironia, pois os habitantes de Bagdad não têm mais que três horas de energia por dia. A última justificação – qual plataforma contra o abraço intercomunitário – não se opõe aos factos: enquanto as execuções duraram perto de cinco horas, domingo, em Al-Jihad, o exército americano não interveio.

A realidade é que, no plano político, a vitória retorna a Abou Moussab Al-Zarkaoui, chefe da Al-Qaeda no Iraque morto em Junho, que tinha prometido esta guerra civil. A realidade é que, no terreno, os Americanos estão entrincheirados nas “zonas verdes” de Bagdad e nas suas bases militares. Baptizaram o exterior das suas fortalezas de “zona vermelha”. Estão sitiados, isolados, e o Iraque tornou-se a sua “zona vermelha”.

Na dia seguinte à morte de Zarkaoui, o embaixador de Washington no Iraque, Zalmay Khalizad, um dos poucos americanos a compreender a realidade e a amplitude do problema, prevenia que a insurreição iria continuar. Ora, o problema agora é outro. A ameaça hoje está na divisão das forças de segurança, cada um empenhando-se em proteger a sua família, a sua tribo, a sua comunidade. Se a rebelião iraquiana e o terrorismo sunita continuarem a semear o caos, a guerra civil pode destruir o país.

Editorial do jornal Le Monde, dia 12.7.06 (traduzido do francês por joãoGonçalo).


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