terça-feira, outubro 03, 2006

 

'Caso empolado'

Em Novembro do ano passado, cinco maduros dirigiram-se a Den Helder, uma pequena vila atlântica do Norte da Holanda. Queriam verificar denúncias sobre exploração e maus-tratos aplicados a trabalhadores portugueses ao serviço de uma agência de trabalho temporário, a The Five.

Os maduros eram cinco: dois jornalistas, o conselheiro da comunidade portuguesa na Holanda, a responsável social da Embaixada e eu próprio. O que apurámos foi relatado pela RTP. Ao longo de meses, continuámos a falar com portugueses que tinham passado por Den Helder. Alguns tiveram coragem para dar a cara e as autoridades holandesas abriram uma investigação.

Realizaram-se, entretanto, dois encontros de trabalhadores temporários portugueses, em Roterdão e Ardenhout, com uma centena de pessoas cada. Outros abusos vieram a lume. Posso, sem exagero, falar de uma comunidade em revolta. Indignada.

Infelizmente, nos serviços diplomáticos, a voz corrente era a de que «a montanha parira um rato». Tanto seria o exagero, que até a conselheira social da Embaixada foi exonerada. Quanto ao inspector-geral do trabalho, Paulo Morgado, disse há dias na RTP-Internacional que «o caso da Holanda foi empolado».

Pois bem, esta semana chegou a resposta, assinada pelo secretário de Estado holandês dos Assuntos Sociais e do Emprego: «Foi estabelecido que a agência The Five pagou abaixo da lei a numerosos trabalhadores portugueses», que lhes deve pagar o que esteja em falta e que as vítimas «podem iniciar um caso civil» contra a firma. Não é muito. E faltam ainda as conclusões de uma segunda investigação, esta de ordem criminal. Mas é um começo.

A vida de jornalistas, de profissionais diplomáticos conscientes e de activistas sociais ante os buracos negros da nossa modernidade, é tramada. Procuram ser úteis e raramente vêem resultados. Persistem, insistem e são vistos como chatos de serviço, quando não como arrivistas. A vida de parlamentar europeu também deixa amargos de boca. Neste caso, foi diferente, valeu a pena. Não sucede muitas vezes, mas acontece. Só é preciso procurar.

Tanta razão

José Sócrates acusou Marques Mendes de irresponsabilidade, a propósito da proposta de criação de um sistema misto de Segurança Social. Invocando um estudo nunca publicado pedido pelo anterior Governo de direita, explicou que as simulações sobre esse modelo agravariam a dívida pública do país em muitos mil milhões de euros nas próximas duas ou três décadas. É óbvio. Alguém terá de pagar o que os salários mais altos deixam de descontar. Em contraste, Marques Mendes acusou o primeiro de apenas querer «remendar» o sistema. Também tem razão...

E esta, hem?

Tem o insuspeito Fórum Económico Mundial um ranking sobre a competitividade dos países. Portugal perdeu umas posições. Era de esperar, dirá o leitor pessimista. Talvez. Sucede que a quebra se deve ao comportamento do sector privado e não do sector público. Este melhora na generalidade dos índices. Quem perde é o mundo empresarial. Em todos os itens relevantes, da investigação à eficácia das administrações. O nosso Estado é deficiente, pois é. Mas o drama nacional é a burguesia que temos. Ignorante, dependente e nova-rica.

Miguel Portas


Artigo opinião do site BE Global.

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